Irmã Teresita, 100 anos esbanjando felicidade

07/12/2023 às 14:08 - Salvador do Sul

Irmã Teresita, 100 anos esbanjando felicidade
Irmã Teresita, 100 anos esbanjando felicidade

 

Logo ao cruzar a porta do segundo andar do Instituto Bárbara Maix, em Salvador do Sul, avistei uma senhora de costas, usando um conjunto azul escuro muito bonito, a caminho do seu quarto. As cuidadoras avisaram que eu havia chegado e ela disse animada que já me atendia. ‘Um minutinho’. Procuramos um lugar iluminado para conversar. Aproveitar o dia bonito de sol, mas sem passar calor debaixo dele. Uma sala ampla, com janelas grandes foi nossa escolha. E logo ela estava de volta. Com passos mais lentos, acompanhada de um andador. Mas com sorriso largo no rosto ela se encaminhou para uma poltrona confortável, com uma mesinha ao lado que tinha um enfeite bem especial que entregava o motivo da nossa conversa. Um bolo ‘fake’, como chamam, carregando o número 100, rodeado de flores. Irmã Teresita, cujo nome de batismo é Adelina Carlotti é a mulher mais longeva de Salvador do Sul.

Simpática, alegre e de bem com a vida. E que vida! Essa é a Irmã Teresita. Em outubro de 2023 comemorou com a família os 100 anos completados após uma trajetória incrível. Veio todo mundo. Familiares e amigos. ‘Sobrinhos, irmãos, que estão vivos né’, diz ela, entre gargalhadas. E comemoraram a vida da Irmã Teresita com um almoço pra lá de especial no ‘hotel’ da cidade, disse ela se referindo a um restaurante do centro. E depois, claro, teve bolo e parabéns a você. Com uma facilidade invejável para contar os detalhes de sua vida, dona Adelina, a Irmã Teresita é um exemplo de como chegar aos 100 anos tão bem.

 

Irmã Teresita, 100 anos esbanjando felicidade
Irmã Teresita, 100 anos esbanjando felicidade

Mas calma, não vamos entregar logo a dica que todo mundo quer saber. Antes precisamos enobrecer a caminhada da Irmã Teresita até aqui. Nascida em 1923 na cidade de Nova Prata, aos 17 anos saiu de casa. Concluiu seu noviciado em 1947 no município de Taquari. Formou-se enfermeira e logo começou a trabalhar em um hospital em Boqueirão do Leão, município gaúcho. De lá, foi transferida para São Paulo e depois uma plataforma na Bahia. Mas foi na cidade de João Câmara, Rio Grande do Norte, que aconteceu a revolução com ajuda da Irmã. ‘Era uma cidade muito, mas muito pobre. Não tinha água encanada. As mulheres tinham 12, 13 filhos. Mas somente dois, três sobreviviam’, recorda ela. Foi então que a Irmã percebeu a sua missão. ‘Prometi que nunca mais uma mãe ou uma criança morreria enquanto eu estivesse lá’, contou.

Mesmo com condições precárias na cidade, Irmã Teresita começou seu trabalho missionário. Conversando com o vigário, transformaram a sua casa no primeiro hospital da cidade. ‘Virou um hospital de mães. Era um abrigo para as mulheres que precisavam de ajuda. Quando sabíamos que uma mulher entrava em trabalho de parto, andávamos quilômetros, coloca em cima de um jipe, e trazíamos para a casa do vigário para fazer o parto. Nos mais de 20 anos que estive lá, nunca mais uma mãe ou um bebê morreu durante o parto’, disse a Irmã com firmeza.

 

Sua missão não parou por aí. Com ajuda dela, as pessoas começaram a pedir por água de qualidade. ‘Eles diziam, sem água, sem voto. E foi com a ajuda dos políticos que conseguimos a água saindo da torneira. Encontraram uma vertente que nunca secava a 30 quilômetros da cidade. Aí, tudo começou a melhorar’, lembra ela. Mas seu sonho para João Câmara ainda estava só começando. ‘A Madre chegou a pedir para mim que voltasse. Mas eu disse que não, meu trabalho em João Câmara não tinha acabado’. Foi então que mais uma grande conquista na cidade aconteceu.

Irmã Teresita auxiliou na criação do Hospital de João Câmara, sobretudo na ala de maternidade, que hoje leva seu nome como homenagem. Ela disse que nunca contou, mas com certeza mais de mil partos foram realizados com ajuda dela. ‘Mil partos não é nada’, disse ela, emocionada. Ela também recorda de uma situação muito difícil que enfrentou na cidade. Em novembro de 1986 a cidade de João Câmara sofreu com um terremoto de 5.1 na escala Richter. ‘Cerca de 4 mil imóveis foram destruídos ou danificados na cidade. Milhares de pessoas deixaram suas casas com medo de desabamentos. Mais de 10 mil pessoas ficaram desabrigadas. Montamos um hospital de campanha na época para auxiliar as pessoas atingidas’, recorda a Irmã.

Depois de contribuir largamente na cidade do Rio Grande do Norte, a Irmã Teresita sentiu que já poderia seguir com sua missão em outra cidade. Mudou-se em 1994 para Aparecida de Goiás, onde trocou o ambiente hospitalar pelo artesanato. ‘Ajudava as mães a aprender macramê e ganhar um dinheirinho para ajudar nas contas da casa’, disse ela, mostrando com os dedos e com sorriso no rosto.

Hoje, em seu novo lar, Irmã Teresita segue uma vida diferente, mas acima de tudo com propósito. Levanta todos os dias 4h30 da manhã, toma banho, reza, assiste à missa. As cuidadoras relatam que está sempre de bom humor e que ela nunca adoeceu. É interessada, gosta de conversar, está sempre atenta. ‘Ela tem apenas a dificuldade de audição, mas é só escrever as perguntas no papel que ela vai conversar contigo por horas’, contam.

Mas tenho certeza que durante toda essa matéria uma pergunta é a mais latente: qual o segredo para viver mais de 100 anos? Se a resposta que você imaginou teve a ver com a prática de exercícios físicos regulares ou boa alimentação, saiba que há outro hábito mais importante: a sua personalidade. É provado cientificamente que ser positivo é o melhor caminho. E sabe qual foi o conselho da Irmã Teresita? Ao indaga-la sobre qual conselho daria para viver 100 anos, ela sorriu, pensou por alguns segundos e respondeu: ‘Alegria. Ser sincero em tudo que fizer. Fazer amizades, respeitar as pessoas. E nunca ficar de braços cruzados. Quando uma coisa não dava certo, fazia de outro jeito’, contabilizou. E com essa lição de vida, levantei agradecendo a atenção e a injeção de ânimo que recebi com essa entrevista. Foi quando ela finalizou com ‘desculpe se falei bobagem, mas é que eu sou meio doidinha’. Bom-humor é a chave de uma vida centenária.

Irmã Teresita, 100 anos esbanjando felicidade
Irmã Teresita, 100 anos esbanjando felicidade