Dois passos para trás
13/11/2024 às 11h13
Cathierine Hoffmann - Jornalista
Jornalista, formada pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Comunicadora multimídia, assessora de imprensa e editora reponsável do Expressão Regional
Lembro bem das eleições americanas em 2016. Fui dormir convicta de que Hilary Clinton seria eleita a presidente. Até lembro de um vídeo em que Obama ria da hipótese absurda de Donald Trump ser eleito. Acordei com a notícia que todos já sabem. A convicção de que Clinton seria eleita mascarava uma verdade absoluta que no fundo todas nós, mulheres, sabemos, mas ficamos esperançosas de que um dia irá acabar: que seremos eleitas por méritos e não desacreditadas pelo gênero.
Nas eleições americanas de 2024, não com os mesmos personagens, mas com o mesmo resultado, Trump venceu Kamala Harris. Esperança de que ela seria eleita, até tinha. Convicção, essa já nem passou pela minha cabeça. Alguns agravantes já são mais presentes: racismo e misoginia, ainda são decisivos, sobretudo na política.
Um tempo atrás assisti uma entrevista da atriz Taís Araújo. Ela contou sobre como foi dilacerada pela imprensa e por críticos ao interpretar uma das Helenas nas novelas de Manoel Carlos. Ela só soube o porquê anos depois, ao se deparar com o racismo ainda muito arraigado em nossa sociedade. Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, Taís Araújo reconheceu que Manoel Carlos foi hodierno ao não explicar a origem de uma personagem negra, até porque, o brasileiro não reconheceu aquela protagonista, que tinha sucesso profissional e uma vida financeira estabilizada, sendo negra. Isso explica nosso racismo estrutural.
O brasileiro é um reflexo americano quando se fala em preconceito. Replicamos, talvez por sermos terras colonizadas, o desprezo com as pautas femininas e também o racismo diário em ambos os países. Esses dias, conversando com uma colega de trabalho, ela dizia que devia haver uma lei para que mulheres na menopausa não precisassem trabalhar em dias de muito calor. À primeira vista, muitos iriam rir da proposta. Mas e quem disse que não é uma coisa séria? As ondas de calor causadas pela menopausa não são apenas desconfortáveis, elas têm um risco aumentado de 50% a 80% de eventos cardiovasculares, como ataques cardíacos, derrame e insuficiência cardíaca. É uma questão de saúde pública. Mas você já ouviu algum político debater sobre esse assunto?
Com a vitória de Trump, uma onda começou a tomar forma de novo, com a supremacia branca e masculina sendo novamente elevada aos olimpos. A luta por equidade não tem um dia de paz. São sempre dois passos à frente, três para trás. Pega fôlego e um passo a frente, dois para trás. E assim seguimos. O desafio é seguir desafiando a narrativa, focar nas novas gerações e seguir lutando.